20 Fev 2016 às 16:18 0 2060 Tecnologia
Cronostase — a mais convincente prova de que vivemos na Matrix
Antigamente havia o conceito de que tempo era absoluto, uma referência externa imune a efeitos físicos, quase uma idéia abstrata. Einstein detonou essa ídéia, demonstrando que não só o tempo é relativo como cada vez que você pega um avião, envelhece mais lentamente do que quem ficou em terra.
Para piorar o tempo não é fluído nem na nossa percepção. Já notou que quando você faz uma viagem de carro pela primeira vez ela parece muito mais longa do que na segunda? E aqueles malditos cinco minutos no final da última aula do dia, que não acabam nunca.
Só que existem alterações de percepção temporal com origem fisiológica. Uma delas é a Cronostase.
Você já teve a sensação, quando desviou o olhar para um relógio, que o ponteiro de segundos estava parado, ficou assim por um tempão e só então começou a andar? Não foi só você. Todo mundo tem essa percepção, e com vários outros efeitos. O nome disso é Cronostase, uma sensação de que o tempo parou ou está especialmente lento que pode durar até meio segundo. A culpa desse efeito? Um negócio chamado Movimentos Sacádicos.
Nosso olho é uma gambiarra evolucionária magnífica. Precisava ser ótimo para trabalho de precisão coordenando com mãos hábeis, precisava de visão além do alcance para caçar e não ser totalmente inútil à noite.
A solução foi uma estrutura que tem extrema percepção de cor e detalhe no centro. Em volta, temos ótima percepção de movimento e luminosidade. O olho é tão sensível que consegue perceber um único fóton, mas para evitar ruído o cérebro filtra, e só reage quando o sinal tem 5 de a 9 fótons num período mínimo de 100 ms. Esses fótons vão em informação de cor, são registrados como movimento e fazem com que o olho foque em sua direção.
Só que a região central do olho é menos sensível, por isso de noite percebemos coisas com o canto do olho mas quando olhamos às vezes não conseguimos ver.
Nós achamos que temos visão IMAX Technicolor wideorama mas se você ficar a um palmo deste texto e fixar o olho nesta palavra, não conseguirá ler mais que uma ou duas pros lados, sem mover o olho.
Esse movimento, chamado sacádico é involuntário e acontece o tempo todo, ajuda a termos uma noção detalhada do ambiente, mesmo quando nos concentramos em alguma coisa. Bom pro proto-macaco ralando um côco numa pedra, péssimo pro leopardo chegando de lado e achando ele com cara de almoço.
Só que quando movemos os olhos, mesmo intencionalmente não temos a sensação de motion blur, e de alguma forma o olha já está focado quando se realinha com o novo objeto. Como pode ser tão rápido?
Não é. Seu cérebro está te enganando, aquele infeliz.
O que acontece: quando o cérebro inicia o movimento sacádico, ele buferiza a imagem (não em pixels, suspeita-se de um armazenamento bem mais complexo) e pára de processar informação, evita o motion blur e mantém uma imagem nítida, mesmo que desatualizada, o que é ótimo se você está fugindo do leopardo supracitado.
Assim que o olho se estabiliza na próxima posição, o cérebro é avisado, reinicia o processamento de imagem, analisa os dados visuais, identifica o que está sendo visto e, só então, você toma conhecimento. Nesse meio-tempo você está vendo uma imagem atrasada e simulada, mas depois que o engasgo inicial passa, percebemos como visão normal, mas a verdade é que sempre estamos algumas frações de segundo atrás da realidade.
Nós somos tão presos a essas limitações, que nossa indústria de entretenimento depende delas. Sem demora no processamento de imagens não teríamos cinema ou TV. No dia-a-dia não importa, somos grandes demais para precisarmos ter medo de gaviões, e mesmo os leopardos mais determinados não são rápidos o suficiente para superar nossa visão.
Outras espécies podem ter tempos de reação e acuidade visual que consigam identificar e desviar de balas. A nossa nunca precisou disso para sobreviver mas também pode ser que, se toda essa história de Cronostase for apenas um bug da Matrix, a gente nem precise aprender a desviar de nada.
Fonte: Meio Bit Por Carlos Cardoso