Marcos Verlaine*
Em pronunciamento na véspera do Dia do Trabalhador, comemorado em 1º de maio, a presidente Dilma Rousseff (PT) garantiu que vai renovar a política de valorização do salário mínimo. Trata-se de promessa de campanha, pois a vigência da norma se encerra apenas no próximo ano.
Pela metodologia atual, os reajustes são calculados com base na inflação (INPC) mais a variação do PIB de dois anos antes. Essa regra foi responsável por um crescimento expressivo do salário mínimo durante as gestões Lula e Dilma. A presidente, porém, não antecipou se a continuidade da política seguirá a fórmula atual.
O compromisso assumido por Dilma a coloca na contramão do consenso no mercado financeiro. Para alguns economistas, esse modelo traz impactos negativos, já que a indexação do mínimo gera inflação e amplia o rombo da Previdência. Projeta-se, então, um cenário problemático para o futuro das contas do país, segundo os economistas ortodoxos, ou seja, os monetaristas.
Posição do movimento sindical
Em oposição ao mercado, o movimento sindical defende a renovação da política sob o argumento da recomposição do poder de compra dos trabalhadores.
Além disso, a regra vigente foi construída com participação das centrais sindicais, que já iniciaram discussões a favor da continuidade.
O assunto é tema de manifestações de trabalhadores e será defendido por sindicalistas em comissão geral (ampla audiência pública) sobre temas trabalhistas no plenário da Câmara dos Deputados nesta terça-feira (6), das 14 às 16 horas.
Projetos de lei
No Legislativo, as vozes contrárias à política do mínimo ainda não se manifestaram publicamente, pois falta coregem, ainda mais às vésperas das eleições. Por ora, apenas os que são favoráveis debatem a questão. Três projetos que visam prosseguir com esse modelo tramitam no Congresso. São dois na Câmara e um no Senado.
Um é o PL 7.185/14, do deputado Roberto Santiago (PSD-SP), vice-presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT), foi aprovado recentemente pela Comissão de Trabalho da Câmara. O projeto visa tornar permanente a política atual e ainda estende o modelo de correção às aposentadorias superiores ao salário mínimo. A matéria será analisada agora pela Comissão de Finanças e Tributação.
O segundo é o PL 7.469/14, do deputado Paulo Pereira da Silva (SDD-SP), que altera a Lei 12.382, de 25 de fevereiro de 2011, com o objetivo de estender o prazo referente à política de valorização do salário mínimo e, consequentemente, o seu aumento real, mantendo os índices de correção vigentes. Isto é, mantém a atual política e a estende até 2019.
Outra proposta, ainda não analisada, o PLS 31/14, do senador Inácio Arruda (PCdoB-CE), prorroga a regra até 2019.
Aécio Neves (PSDB) e Eduardo Campos (PSB), adversários de Dilma nas eleições de outubro, sinalizaram disposição de rever o modelo, mas têm revelado cautela em seus discursos. A questão é delicada eleitoralmente, pois ninguém quer ficar mal nem com os trabalhadores nem com o mercado.
Importância do mínimo
O salário mínimo é mais que uma referência, um indicador social, que mede a importância do piso salarial nacional na agenda do governo e sua relação com os assalariados.
O mínimo é uma referência geral para todos os trabalhadores, sejam assalariados de um mínimo ou não, pois os pisos de todas as categorias econômicas e profissionais acabam se referenciando no salário mínimo nas respectivas datas-bases.
Quanto maior for o mínimo, mais altos serão os demais salários. Mais de 40 milhões de trabalhadores, incluídos aí aposentados e pensionistas recebem o piso nacional.
O mínimo em 24 anos
A partir de 1990, apesar da permanência de altos índices de inflação, as políticas salariais foram capazes de garantir o poder de compra do salário mínimo, que apresentou um crescimento real de 10,6% entre 1990 e 1994, em relação à inflação medida pelo INPC.
Com a estabilização econômica após o Plano Real, o salário mínimo teve ganhos reais ainda maiores, totalizando 28,3% entre 1994 e 1999. Neste mesmo período, considerando-se a relação do valor do salário mínimo e da cesta básica calculado pelo Dieese na cidade de São Paulo, o crescimento foi de 56%.
Há duas conclusões importantes a destacar a partir dos dados que mostra a evolução histórica do salário mínimo desde 1940. Em primeiro lugar, ao contrário de manifestações muito corriqueiras de que o poder de compra do salário mínimo seria hoje muito menor que na sua origem, os dados mostram que não houve perda significativa.
Em segundo, foi com a estabilização dos preços a partir de 1994 que se consolidou a mais significativa recuperação do poder de compra do mínimo desde a década de 50.
Era Lula
Em 2008 o presidente Lula resolveu `arredondar` o valor do salário mínimo que seria pouco mais de R$ 413 para R$ 415, com vigência a partir de 1º de março.
Em 2009 o reajuste deu-se a partir de 1º de fevereiro (R$ 465) e, em 2010, a partir de 1º de janeiro (R$ 510). Nos anos vindouros o reajuste praticar-se-á sempre no dia 1º de janeiro com pagamento, já com o reajuste incorporado, até o 5º dia útil do mês de fevereiro. O mínimo hoje está em R$ 724 e o novo reajuste prevê que em 2015 será de R$ 780, uma correção de 7,71%.
Para o economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Mansueto Almeida, a decisão sobre a fórmula de correção do salário mínimo não é econômica, e sim política. `O governo tem que mostrar o custo disso e levar o debate para o Congresso [em 2015]. É um tema bastante complicado`, avalia.
Almeida afirma que a atual fórmula (inflação mais variação do PIB nominal) permitiu um aumento real (acima da inflação) de 72% para o salário mínimo nos últimos dez anos, o que contribuiu para diminuir as desigualdades sociais no Brasil.
Por outro lado, acrescentou o economista, o reajuste real do mínimo impactou as contas públicas – com aumento de gastos com previdência, seguro-desemprego e assistência social –, diminuiu a produtividade da indústria e pressionou a inflação.
(*) Jornalista, analista político e assessor parlamentar do Diap e da Conatec